quarta-feira, 10 de junho de 2009

Em diálogo

Vivemos tempos de crise em que a recessão se apodera da bolsa e em que a economia vacila entre o precipício e o abismo, contudo a crise não é só económica. A crise de valores tanto é a mais problemática como é a que se arrasta há mais tempo.
Não há nenhuma solidariedade ou fraternidade entre os cidadãos, todos eles esperam a graça divina enquanto se deixam comandar como triste rebanho subserviente. Toda a vida intelectual, todo o dinamismo humano, paralisado. Ninguém se interessa, ninguém tem esperança, a guerra entre Deus e os clisteres dilata-se, tentando um arrebanhar mais fiéis que o outro.
A preguiça e o comodismo não levam este país e, nomeadamente, esta terra, a lado algum. A única coisa que continua a vingar é o consumismo. É preciso despertar, é necessário agir, é necessário mudar…
Neste âmbito foram contactados quatro cidadãos que prezam pela sua actividade política e social neste concelho, de modo a legarem o seu juízo sobre a pergunta abaixo transcrita, pedido ao qual muito pronta e amavelmente acederam.

Pergunta:
“Em Oliveira do Hospital verificamos uma perfeita e absoluta indiferença em relação a tudo.
O comércio local definha, faltam incentivos e iniciativa. A cultura resume-se a teatros de revista, música popular e ciclos de cinema esporádicos e desaproveitados pela população. Apenas a cultura de massas vinga.
A nível político sofremos como qualquer meio pequeno. A prática da vida tem por única direcção a conveniência.

Peço que fundamente a sua opinião, a favor ou contra, o paradigma acima referido, apontando iniciativas que permitam a alteração do status quo.
Aponte directrizes que o executivo camarário deva seguir de modo a estabelecer um autêntico e contínuo progresso.
Como alterar a imagem interna e externa do concelho, tornando-o dinâmico e vanguardista”


Respostas Avançadas:


João Dinis, Presidente da Junta de Freguesia de Vila Franca da Beira

Está correcto muito do “diagnóstico” feito. O problema é determinar as verdadeiras causas e prescrever os “remédios” mais acertados...
Bom, poderíamos começar dizendo que é a culpa é “da crise” – como agora nos dizem os governantes por tudo e por nada - resposta verdadeira mas muito insuficiente.
No plano das competências e responsabilidades da Câmara Municipal e do nosso Município, a maior tarefa é a de melhorar as infra-estruturas básicas fundamentais sobretudo aquelas que já estão degradadas como a rede pública de distribuição de água e o saneamento. Todavia, a Câmara foi “obrigada” a entrar para a empresa “Águas do Zêzere e Côa” à qual agora compete executar esses trabalhos mas que está a falhar muito, para além de ameaçar com grandes aumentos quer para o preço da água ao domicílio quer para o preço do saneamento... Ora, isto pode vir a causar sérios problemas sociais.
No plano do acompanhamento social a “carenciados”, há uma grande confusão entre várias Entidades que estão incumbidas de dar apoio a crianças, jovens e idosos mas que não se coordenam entre si para serem mais eficazes. Também por isso, gasta-se muito dinheiro público e não há os melhores resultados.
Ao mesmo tempo, o Ministério da Saúde não atribui meios financeiros e recursos humanos para se atacar a fundo o muito grave problema do alcoolismo, o da violência doméstica e também já o da droga.
Quanto à Educação e ao Ensino, regista-se um decréscimo das populações escolares. Paradoxalmente, aquela Escola que até tem aumentado o número de alunos, a ESTGOH, Escola Superior de Tecnologia e Gestão de Oliveira do Hospital, essa continua em instalações provisórias e acanhadas sem que o governo mande construir as novas e indispensáveis instalações para esta ESTGOH.
Se formos analisar com atenção a programação anual da Casa da Cultura César de Oliveira, teremos de reconhecer que são diversificadas as iniciativas que lá se realizam.
O problema maior é que a “televisão” puxa a “malta” para coisas fúteis. O problema é que a televisão é um venenoso meio de alienação e de intoxicação e, contra ela, a Câmara Municipal “pode pouco”...
No plano desportivo, Oliveira do Hospital não está mal, e até tem várias modalidades e muitos clubes em movimento. No plano recreativo e dos recursos naturais, temos o grave problema da poluição da águas dos Rios e, por falta de iniciativa e de apoios, não há planos inter-municipais e governamentais capazes de lhe fazer frente nos próximos anos. É preocupante.
No plano económico, a Agricultura, a Indústria e o Comércio – que vivem mesmo uma grave crise - precisam urgentemente de outras e melhores políticas, com mais e melhores apoios do governo central. De outra forma, o Concelho desertifica-se com o êxodo forçado da População (embora, hoje, também não se saiba bem para onde se possa ir...). Ora, as Pessoas são o melhor que temos em Oliveira do Hospital !
Entretanto, é natural reconhecer que, nos últimos anos, o nosso Município melhorou bastante o seu aspecto e basta olhar ao andar pela Cidade e ao circular por várias das nossas Estradas que, regra geral, estão melhores. Porém, aqui na zona urbana da Cidade, há muitos gastos desnecessários com rotundas cheias de conjuntos escultóricos ainda por cima encomendados a um só artista e sem que, previamente, tenha havido um “concurso de ideias” para se poder escolher.


António Campos, Ex. Euro-Deputado

Oliveira do Hospital é um concelho do interior, distante de qualquer pólo de desenvolvimento.
Guarda, Viseu ou Coimbra encontram-se a cerca de 80 Kms de distância.
O concelho é caracterizado pelo envelhecimento da sua população e concentração crescente da mesma na cidade.
Mantêm características muito acentuadas de ruralidade que é bem visível ao fim de semana com o despovoamento da cidade para as aldeias.
Mantêm um nível de vida estável dado o elevado emprego feminino, ligado principalmente às confecções.
Tem fraco emprego qualificado e são raros os jovens com formação superior que se conseguem realizar no concelho.
Essa cultura rural, sem grupos altamente qualificados, torna-o um concelho politicamente conservador, avesso à discussão, à reflexão e às mudanças que marcam as sociedades modernas.
É muito difícil a mobilização para a participação cívica e nem o futebol a consegue despertar.
As freguesias vivem à volta das suas associações que acima de tudo são centros de convívio, com excepções para as poucas que dinamizam bandas, tunas e ranchos, aliás ligadas à sua ruralidade.
As pessoas idosas e as crianças são o principal problema social no concelho.
A rede de lares e creches tem evoluído mas as carências para os idosos vão-se acentuando.
A mobilização à volta da cultura é o esforço de um pequeno grupo ligado à associação cultural OH.s XXI que não tem conseguido vencer o alheamento instalado.
A criação de um grande espaço, ligado ao convívio, à cultura e à leitura, seria a forma de inverter esta alienação individualista a que o concelho se resignou.
Com a implementação do Ensino Superior no concelho há um esforço a fazer, que é o de integrar essa comunidade na vida local e a forma ideal é pela cultura, convívio e leitura.
Tão importante como as vias de comunicação para ultrapassar o isolamento do concelho é dar vida à comunidade.
As sociedades informadas e actualizadas no tempo em que vivem são sem dúvida a melhor forma de as preparar para enfrentarem o futuro com êxito.


Luís Lagos, Jurista

Não podia estar mais de acordo com a análise que a pergunta incorpora. De facto, com grande pena minha ao afirmá-lo, mas com a certeza que o sentir geral o confirma, o concelho mingua, definha e decresce em quase todas as áreas.
Não tenho dúvidas que muita da responsabilidade dessa estagnação e inércia cabe aos responsáveis políticos locais, independentemente da sua filiação partidária. Digo mesmo que cabe a todos. A uns porque, tendo a responsabilidade de governar, nunca souberam criar condições para o aparecimento do concelho com que todos sonhamos, o concelho que floresce, dinamiza e lidera a região. Aos outros porque, na verdade, também nunca foram capazes, a partir da oposição, de o propor e incentivar numa lógica construtiva.
Perguntam-me medidas para alterar o status quo. Deixo antes aqui um apelo e várias sugestões, que tenho por essenciais para o nosso sucesso colectivo enquanto concelho.
Um apelo aos jovens para que se interessem mais pela actividade politica e cívica. Um apelo para que não continuem a passar “cheques em branco” à classe política e a deixar que os outros decidam por si. Um apelo para que nas associações, nas organizações de juventude, nos partidos políticos façam valer as suas sugestões e opiniões. Acredito muito que só com a participação e empenho da juventude, com a sua força regeneradora e apostando na sua irreverência e capacidade de proposta podemos ambicionar e alcançar o concelho com que todos sonhamos. Sem ela será difícil, se não impossível.
As sugestões para dinamizar e alterar a imagem do nosso concelho são, entre outras, a aposta em políticas locais de discriminação positiva para as empresas que criem postos de trabalho; a criação de áreas de localização empresarial com serviços de apoio às empresas, o aparecimento de políticas de promoção e apoio à indústria do turismo e de valorização do património; o apoio à formação dos empresários; a criação de uma Marca atractiva que identifique o concelho; medidas de apoio à fixação, à natalidade e à família como seja a concessão camarária de uma bonificação no empréstimo de compra de habitação para residência permanente; a condução do Ensino Superior local para as áreas estratégicas do desenvolvimento regional – Turismo, Produtos Tradicionais; a utilização do património ambiental enquanto bem estratégico de desenvolvimento sustentável; a criação do Bilhete de Família que concederá descontos em actividades culturais, educativas, desportivas ou recreativas promovidas directamente, ou por concessão, pelo Município, independentemente do número de elementos do agregado familiar; etc.
Mas volto a afirmar, o mais importante para que tenhamos o concelho com que sonhamos é que uma nova geração se envolva e deixe a sua marca. Que uma nova geração se empenhe e construa a mudança.



José Carlos Mendes, Professor


Ser descontente é ser homem.
Não há dúvida - Oliveira do Hospital passa por uma fase de desenvolvimento muito cinzenta. Os Oliveirenses sentem que as potencialidades da sua terra não estão a ser devidamente aproveitadas. Nota-se um desencanto generalizado. Os mais jovens e os mais insatisfeitos procuram outras paragens para concretizar os seus sonhos.
Os responsáveis por toda esta situação somos todos nós. É nosso dever, na altura própria, lutar pela alteração daquilo que consideramos que está mal e colaborarmos de uma forma empenhada na construção de um novo rumo.
Consideramos que o poder político, nomeadamente o executivo camarário, falhou redondamente na implementação de medidas que nos levassem a acompanhar o desenvolvimento verificado na maior parte dos concelhos do País.
Nunca é tarde para inflectirmos caminho. Está na hora de alterarmos este estado de coisas.
Como diz Fernando Pessoa “ Ser descontente é ser homem”. O sonho é leit motiv da vida. Tristes daqueles que se contentam em ficar sentados à lareira sem Sonhar. A insatisfação permanente e o sonho devem constituir a base do nosso dia-a-dia.
A Instituição Câmara Municipal tem de ser rapidamente humanizada.
Os Oliveirenses têm de sentir que a Instituição Câmara Municipal é de todos. Todas as pessoas têm de ser recebidas da mesma maneira. Os seus problemas têm de ser resolvidos de uma forma legal mas também célere. As suas opiniões têm de ser respeitadas e levadas em conta quando tragam uma mais valia ao projecto.
Em suma, não pode uma só pessoa definir a seu belo prazer, de uma forma prepotente e centralizadora, aquilo que considera melhor para todos nós. Não pode fazer da Câmara Municipal uma “Coutada” sua.
Apesar das grandes potencialidades do nosso concelho temos vários constrangimentos que na altura própria não soubemos ultrapassar, desperdiçando fundos comunitários e nacionais que nos permitiriam, neste momento, estar na vanguarda.
O desenvolvimento que todos ansiamos passa fundamentalmente por potenciarmos os recursos humanos e materiais que possuímos. Passa pela construção de um verdadeiro projecto de desenvolvimento onde todos os Oliveirenses se revejam e pela implementação de políticas que, de uma forma harmoniosa, permitam a sua concretização.
Um autêntico e contínuo progresso tem de assentar no projecto atrás referenciado, onde forçosamente terão de ser definidas prioridades, onde as várias áreas (social, obras públicas, cultural, desportiva, económica, educativa, associativa, etc.) se interliguem de uma forma harmoniosa, onde os investimentos públicos e privados tenham sentido de forma a trazerem mais valias para todos os Oliveirenses.
Um autêntico e contínuo progresso não pode passar por situações em que continuamos a ter pessoas sem acesso a infra-estruturas que permitam suprir as suas necessidades básicas e ao mesmo tempo estarmos a gastar fortunas em ornamentação de rotundas e em silos subterrâneos para automóveis. Como exemplo podemos referir que na Vila de Seixo da Beira existem cento e uma habitações que ainda não possuem saneamento básico.
Há que invertermos a situação congregando esforços, criando pontes de entendimento entre os principais intervenientes na vida do concelho, envolvendo todos aqueles que possam ser uma mais valia para o desenvolvimento desejado.
No entanto, é fundamental, de uma forma isenta e sistemática, proceder a uma avaliação das políticas implementadas que permita reajustar o projecto de desenvolvimento às dinâmicas previamente definidas.
Estou certo, pelo que vou sentido e ouvindo, que os Oliveirenses em Outubro próximo mediante os projectos políticos apresentados não deixarão de fazer as mudanças políticas necessárias para que todos, sem excepção, sintam que vale a pena viver em Oliveira do Hospital.

2 comentários:

Vítor Fernandes disse...

oi. parabens pela excelente revista. é bom ver juventude a divulgar cultura e com espirito critico em relação à sociedade estagnada em que vivemos. todas as pedradas no neste charco imundo são bem vindas
VITOR PAULO FERNANDES

Adr disse...

Agradeço imenso o apoio que demonstra. Dentro em breve publicar-se-à os níveis de adesão, da população oliveirense, à presente revista.
Em nome do grupo aproveito também para incentivar a discussão sobre qualquer um dos temas publicados. Obrigado

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